Marcio Baraldi
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Deu em O Globo:União faz a defesa de acusados de tortura
Governo evoca Lei da Anistia ao contestar ação contra coronéis da reserva que chefiaram DOI/Codi nos anos 70
Ricardo Galhardo
SÃO PAULO. A União assumiu a defesa dos coronéis da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir dos Santos Maciel, alvos de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) pela tortura de presos políticos e a morte de pelo menos 64 deles entre 1970 e 1976, período em que comandaram o Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI/Codi) do Exército.
Na prática, segundo fontes do Ministério Público, significa que o governo optou pela defesa dos acusados, quando poderia se manter neutro ou até mesmo se posicionar a favor das punições. Agora a União também é ré na ação.
Este ano, o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, chegaram a se manifestaram a favor da punição aos torturadores, mas foram desautorizados pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, que teria manifestado opinião do presidente Lula.
Na contestação de 44 páginas apresentada em 14 de outubro pela Advocacia Geral da União à 8ª Vara Federal Cível de São Paulo, a advogada Lucila Garbelini e o procurador-regional da União em São Paulo, Gustavo Henrique Pinheiro Amorim, defendem a tese de que a Lei da Anistia de 1979 protege os coronéis: "A lei, anterior à Constituição de 1988, concedeu anistia a todos quantos, no período entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos (...). Assim, a vedação da concessão da anistia a crimes pela prática de tortura não poderá jamais retroagir".
A ação do Ministério Público contra Ustra e Maciel é a primeira a contestar a validade da Lei da Anistia para acusados de tortura. Na ação, os procuradores federais Marlon Weichert e Eugênia Fávero pedem que Ustra e Maciel restituam à União todo o dinheiro pago em indenizações a vítimas de tortura no DOI/Codi, principal centro de repressão política em São Paulo entre 1970 e 1976. No período, segundo dados das próprias Forças Armadas divulgados no livro "Direito à Memória e à Verdade", da Presidência da República, 6.897 pessoas passaram pelo DOI/Codi.
Até intimidade das vítimas vale como argumento
AGU sustenta que famílias podem não querer 'reabrir feridas'
SÃO PAULO. Na contestação, a Advocacia Geral da União cita a proteção à intimidade das vítimas de tortura como argumento para defender os ex-comandantes do DOI/Codi. "É necessário ao Estado preservar a intimidade de pessoas que não desejam 'reabrir feridas', isto é, não gostariam que determinados fatos do período de exceção viessem a lume", afirmam os advogados.
Além de indenização, a ação do Ministério Público pede que a União forneça os nomes de todos os que passaram pelo local, a identificação dos torturados, a identidade dos mortos dentro do DOI/Codi ou em ações externas de seus agentes, as circunstâncias das mortes, o destino dos corpos, os nomes dos torturadores, a responsabilização pública de Ustra e Maciel e a perda das funções públicas eventualmente exercidas por ambos.
Maciel está morto. Em outras ações movidas por vítimas da repressão política das quais foi alvo, Ustra disse que apenas cumpria ordens.
OAB entra com ação no Supremo Tribunal Federal
Entidade agora quer decisão sobre Lei da Anistia
Carolina Brígido
BRASÍLIA. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou ontem com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que a Corte declare que os crimes praticados por militares e policiais durante a ditadura, como a tortura e o assassinato de militantes, não tenham a cobertura da Lei de Anistia. Em agosto de 1979, o presidente João Figueiredo concedeu anistia a todos que "cometeram crimes políticos ou conexos com estes" entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. A OAB entende que os torturadores não estão protegidos e devem responder por seus crimes.
"É sabido que o dispositivo foi redigido intencionalmente de forma obscura, a fim de incluir, no âmbito da anistia criminal, os agentes públicos que comandaram e executaram crimes comuns contra opositores políticos ao regime militar", diz a ação assinada pelos advogados Fábio Konder Comparato e Maurício Gentil Monteiro. "É irrefutável que não podia haver e não houve conexão entre os crimes políticos, cometidos pelos opositores do regime militar, e os crimes comuns contra eles praticados pelos agentes da repressão e seus mandantes no governo".
- Tortura não é crime político em lugar nenhum do mundo - argumenta o presidente da OAB, Cezar Britto.