quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

FUTEBOL É COISA DE MULHER, MARXISTA.*

Por Fabrício Luís Duarte, Gustavo dos Santos Cintra Lima e Rodrigo de Melo Ferreira**

Enviado pelos autores por e-mail ao Mídia de Luta!



Prefácio

O presente artigo é uma discussão articulada entre gênero e marxismo, no que se refere à busca pela expansão do futebol praticado por mulheres no Brasil. Primordialmente, são analisadas as dimensões reais provenientes da luta pela institucionalização dessa prática nesse país, visto que o esporte tem assumido cada vez mais a forma de reforço à hegemonia da classe dominante.

Introdução

A luta pela prática futebolística feminina perpassa também os mais diversos campos de investigação intelectual sobre gênero, que culminam muitas vezes somente num embate a favor da participação das mulheres nessa prática. Entretanto, esquece-se que o esporte tem assumido cada vez mais a posição de prática para alívio da pobreza, amenizadora dos conflitos de classes, de reprodução da ordem social vigente, de reforço à hegemonia da classe dominante. Portanto, é mister compreender a luta pela prática futebolística feminina no Brasil dentro dum contexto de capitalismo neoliberal. A história da luta das jogadoras mulheres pela prática do futebol é também a história da luta de classes. É necessário discutir em que medida a participação das mulheres na prática futebolística revela uma dimensão, assim como a prática dos homens, de reprodução da ordem social. Em suma, este artigo propõe a articulação dos conceitos do marxismo e de gênero nos debates acerca do futebol praticado por mulheres.

Pensando a inserção das mulheres no futebol – um histórico dos debates.

(...) a própria criação da versão feminina da Copa do Mundo é fruto desse processo de organização e institucionalização, que em alguns países criou uma estrutura equiparável, quando não superior, à do futebol masculino, como na China e nos Estados Unidos, para citar dois dos casos mais significativos. ( FRANZINI, p. 316)

É fato que o futebol feminino tem se estruturado em bases de sustentação, em alguns países, maiores do que a do futebol masculino. Porém, no Brasil, essa realidade se revela um pouco distante. É necessário questionar qual o papel das mulheres no país do futebol, segundo Franzini. Este, responde a essa pergunta na medida em que analisa o processo histórico de opressão da prática futebolística feminina. Cercada de preconceitos, a prática do futebol por mulheres, tem sido realizada mesmo na ausência de infra-estrutura e de institucionalização da prática no Brasil. Muitas buscam a realização de suas vontades em outros países que oferecem melhores condições para a prática. No Brasil e em muitos lugares do mundo ainda predominam frases machistas e moralistas do tipo: “futebol é coisa pra macho”. As jogadoras brasileiras ainda são vistas como mulheres que subvertem papéis, visto que abandonam suas “funções naturais”, como os afazeres domésticos e a maternidade, para invadirem o “espaço dos homens”. É necessário desconstruir essas noções.

Segundo:

Em andamento: encontrar as bases do preconceito contra a pratica feminina do futebol, e ver que isso não é suficiente quando analisado por um viés marxista.

Por fim: Ver que é necessário, além disso – da ruptura do preconceito -, romper com o sistema capitalista.

Pensando a inserção das mulheres no futebol - rompendo com as noções anteriores, ou seja, desnaturalizando a subordinação das mulheres, mas também rompendo com o capitalismo.

Viemos ao longo do programa de aula da referida disciplina na qual discutimos fortemente as implicações analíticas da categoria gênero em diversas ópticas e articulações para um entendimento cada vez mais satisfatórios das relações em sociedade (em especial as compartilhadas nos nossos dias).

Partimos sustentados pelos debates à respeito dessa categoria (gênero) para engendrar uma analise sociológica da questão do esporte no contexto da organização neoliberal das relações sociais, em especifico a problemática do futebol feminino, tanto na sua prática não-oficial, e em especial na sua prática institucionalizada, entendendo isso como, primeiramente: um processo mercantilizador natural à lógica de maximização inerente ao sistema capitalista e mais cruel na sua fase de integração global respaldada pelo Estado com políticas públicas de camuflagem e atenuamento das desigualdades classistas.

Em segundo lugar a questão muitas vezes descartada, da mulher nesse processo, de como o discurso hegemônico trata como falácia, ou se aproveita das discussões em pauta para revertê-las em lucro das mais variadas formas, notícias, informações, tudo com impulso à máquina esmagadora do capitalismo.

Como a questão do esporte se torna claramente um foco fecundo de investimento para reprodução da ordem vigente, através das políticas de Estado complementadas pela iniciativa privada, criação de campeonatos, confederações, clubes/empresas, e outros artifícios que visam tornar atrativo para um fim específico o consumo das práticas esportivas.

A oficialização/institucionalização/naturalização/mercatilização social das práticas esportivas masculinas há muito se assiste, desde o contexto da guerra fria o capital a utiliza como forma de camuflagem dos conflitos de classe e não só esses, também dos conflitos raciais e étnicos, sendo a disputa esportiva uma luta de formas menos “selvagens”, pois, um dos orgulhos da sociedade industrial é o nível civilizatório compartilhado e disponível a “todos” os indivíduos dessa sociedade “democrática”.

A pratica esportiva desenvolveu-se como forma natural para os homens (masculino), cristalizando-se essa idéia como uma característica inata aos corpos masculinos, por questões das mais absurdas justificativas, como a questão da força física concentrada nos corpos masculinos e deficiente nos corpos femininos.

Com o avanço histórico dos processos sociais e o desenvolvimento do capitalismo chegamos mais claramente a ter que considerar para uma analise sociológica mais satisfatória a variável ou a categoria gênero e não só as questões aparentemente estritas a luta de classes, endossamos a analise marxista nesse artigo mas buscando avançar, articulando os conflitos sociais como sendo também conflitos de gênero.

Entendemos que o processo recente e ainda em curso do tratamento das praticas esportivas femininas (futebol em foco) sofre as mesmas implicações lógicas e dirigem-se ao um mesmo horizonte que as práticas masculinas passaram, claro com particularidades que se mostram ao enxergarmos as relações como relações de gênero também.

Como diz Meszaros ao tratar da questão da educação (em “Educação Para Além do Capital”), do sistema educacional da sociedade capitalista, dizendo que essa se converge para esfera do trabalho nas formas capitalistas de relação para o inculcamento da ideologia dominante no indivíduo, podemos estender essa perspectiva para as diversas esferas de sociabilidade que o indivíduo compartilha no seu cotidiano, como no caso da pratica esportiva.

Também como diz Foucault na sua análise sobre os corpos, trazendo isso para o campo das discussões de gênero e da pratica do futebol feminino, ele trata a materialidade do corpo “anterior ao discurso” ou como de certa forma um substrato da cultura, então o corpo como esfera de atuação das ideologias, que são impressa nos indivíduos, reproduzidos e transferidos nas suas praticas cotidianas através das relações estabelecidas e autorizadas socialmente.

No futebol feminino como uma pratica esportiva em processo de institucionalização essa atuação ideológica através dos corpos femininos é extremamente explorada como forma de reiteração do imperativo capitalista e deslocamento dos conflitos surgidos das contradições da sociedade capitalista, como divergências isoladas de grupos contra-democráticos.


*Artigo apresentado à disciplina “O Gênero como categoria de análise socialna Universidade Federal de Uberlândia.

**Fabrício Luís Duarte, Gustavo dos Santos Cintra Lima e Rodrigo de Melo Ferreira são estudantes de Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns Rapazes! Quando homens se preocupam com questões de genero, analisando a problemática com tanta propriedade, podemos acreditar que a sociedade pode sim encontar o caminho da igualdade e respeito.